segunda-feira, 6 de abril de 2009

PALAVRAS APENAS, PALAVRAS PEQUENAS...

Ando pensando em estrangeiros. Ando pensando no quanto nos afeiçoamos a pessoas, lugares e coisas que a princípio nos eram "estranhos", e que depois de um tempo aquilo simplesmente torna-se parte de nós. E tornando-se parte de nós, não fazem mais diferença, ou sentido. Ando pensando no amor, e em como cada um de nós, seres mediocrimente humanos, dependemos dele, do Amor, para que nossas vidas façam algum sentido. Alguns insistem em chamar de Deus esse Amor com letra maiúscula e assustadora. De qualquer forma, invariavelmente, arrumamos sempre alguma desculpa para dar sentido e rumo ao caos que é a existência. Será que alguém já escreveu sobre isso? Provavelmente.

Ando pensando em hiatos. Em períodos de vida que são hiatos. Talvez eu esteja em um hiato profundo e consciente. Ando pensando em sinceridade. Ando pensando em "ei, o que é que você vai fazer da sua vida?". Não é fácil definir um rumo e simplesmente continuar na caminhada dessa porcaria coisa que chamamos de viver apesar de. Apesar de... apesar de. Apesar de, continuamos por aqui, tentando, na luta. É bonito, muito bonito por sinal, ouvir um trabalhador braçal, que a princípio entende lhufas dessa coisa filosófica - coisa que os metidos a intelectuais se dizem conhecedores profundos -, dizer que "apesar de, moça, a gente continua aqui, remando". Será que ele conhece Sartre?, questiono em vão. Não, ele não conhece. Conhece sim a dura realidade da vida, e o fato de que, todos os dias, os guris tem que comer pão e tomar leite pela manhã. É a vida empurrando o sujeito. O mais irônico de tudo é saber que esse sujeito aí - esse "trabalhador braçal" que julgamos ignorante porque provavelmente passará a vida toda com os olhos vendados para a "verdade" da existência - o mais irônico é saber que ele sim vai viver dignamente perante a sua existência idiota e mesquinha. Quem precisa de dignidade para consigo próprio, quando a própria se encarrega de esfregar na cara a sua dura realidade? Ninguém precisa. Outra ironia: o intelectual, que vaticina que a vida não tem sentido, mas que SABE que os filhos também tem que comer seu paõzinho, e beber seu leitinho - coitado desse sujeito. É o que mais "sofre". De um lado a realidade, empurrando e esmagando com milhões de obrigações, de outro a poesia - a cruel poesia. Ou filosofia, pra quem preferir algo mais "racional".

Ando pensando em Clarice. A louca que se entregou inteiramente à sua loucura, e teve a coragem, a benigna coragem, de mergulhar fundo no que realmente era. Ou no que lentamente se transformava, enquanto ia contando os dias pela folha do calendário. Esquizofrênica? Provavelmente. Mas lúcida, e tão lúcida, que chego a desconfiar que vivia profundamente nauseada de tudo. Aquela mulher foi corajosa o suficiente para continuar por aqui, apesar de. Será que ela acreditava no Amor? Ou no amor? Quem sabe em um deus? Pode ser. Mas acho que em Deus ela apenas se resignava.

Ando pensando que minha vida não daria um livro. E acho tão reconfortante saber que não daria, e que provavelmente nao dará. Pode até parecer que estou "desdenhando das uvas porque estão verdes", mas não, não é isso. Estou apenas resignada de que provavelmente essa será a minha verdade: tô aqui para o que mesmo? Pra nada, apenas passar incólume às doenças e atrocidades. No mais é lucro. É, porque enquanto alguns fazem questão de mostrar a que vieram, eu me contento em assistir de camarote ao espetáculo dos humanóides que tem sempre um show pra apresentar. E talvez essa afirmação pareça um tanto quanto hipócrita, haja visto que estou aqui, escrevendo pra quem quer que seja ler. Mas não, não é. A angústia tem que escorrer pra algum lugar. Tá, ok... e digamos que é também porque não escapo da condição humana, então...

2 comentários:

Hélida disse...

lindinha....
"apesar de" foi durante um tempo uma espécie de "mantra" que minha
(algo louca) voz interior repetia... me tornei como que uma especialista em "apesar de".
"Apesar de" levantar pela manhã....
e sorrir; e dizer bom dia;e comprar removedor pra limpar os armários; e acreditar em novos dias e motivos...mesmo sabendo que sentido não há!
Sendo assim foi com esta sensação de "espelho" que novamente mirei em algo escrito perigosamente familiar....Devo dizer que acontece desde que te conheci!!!

Uma pista (só uma frágil pista neste mistério) foi uma das poucas coisas que sobraram com relativa integridade: a arte é sempre um refúgio válido....a amizade também!

Caco disse...

Bem interessante seu ponto de vista. Me sinto assim às vezes também. Meio no camarote, espiando as coisas e as gentes.
Um beijo
CACO