A CULTURA DA SAIA JUSTA IRRITANTE

Zap-zap-zap: GNT! Huum, bom... um canal feito especialmente para a mulher. Programa: alternativa saude. Tema: saude. Apresentadora: uma gostosona da década de 80 que agora é uma mulher à frente do seu tempo: Patrycia Travassos. Assistente de Patrycia junior: uma moça descolada que vai a Machu Picchu fazer uma reportagem sobre espiritualidade. Alguns índios, algumas rezas, muito papo metafísico (nessa hora me lembro com carinho das palavras de papai Newton, o Isaac: Ó, Física! Poupe-me da Metafísica!), muito bla-bla-bla e uma constatação: cadê o meu Nieztsche? (detalhe: o ápice do programa foi ouvir um cara com jeito, cara e barba de papai noel dizer que existem muitas pessoas no hospício que são consideradas "loucas" mas que na verdade não são loucas, e sim espiritualmente perturbadas). Fim do programa. Análise: papo pra mulher que acha que só porque faz yoga, se trata com medicina ayurvedica, é budista e SÓ come comida macrobiótica é inteligente, moderna e à frente do seu tempo.

Próximo: Saia Justa. A coqueluche das mulheres com cérebro de mingau que acham graça num quarteto composto por: duas atrizes, sendo uma aspirante a escritora e a outra ex top model que fala inglês e francês, uma jornalista (a melhorzinha) e uma filósofa que ri da cara das outras porque ali, naquele meio inóspito, se considera a fêmea alfa entre duas blondies e uma nerd. Tema: trivialidades que possam causar saia justa em quem assiste. Enredo: tricotar sobre o cotidiano, descer a lenha no presidente do brazil-zil-zil, lançar o olhar burguês-padrão para as mazelas da cidade maravilhosa e encher linguiça com filosofia de salão de cabeleireiro. Tema de hoje: alguma coisa sobre afeto - ou a falta dele - de pais para com seus filhos, corpos fuzilados em carrinhos de supermercado e a mudança do padrão dos pinos das tomadas de energia elétrica. Ah sim, havia me esquecido: e também descer a lenha no PAC, no complexo do Alemão e no tunel Rebouças que alaga quando chove - o que as impossibilita de voltar para suas casinhas em seus Mercedez blindados. Primeiro fala a jornalista - atenção, momentos de tensão! a saia justa será lançada... entra a aspirante a escritora e discursa sobre a condição dos viciados - longo discurso -, e logo depois arremata com a seguinte conclusão: o Estado tem que obrigá-los a fazer o tratamento. Ponto. Assim, à força. Momento "meninas fazendo sim com a cabeça". Fala a jornalista: alguma coisa sobre um estudo bla bla bla... o tema do assunto muda - elas estão tricotando, lembrem-se! - a jornalista lança a saia justa, a aspirante rebate, a modelo balbucia e a filósofa está no mundo da lua - ou da Viviane Mosé. De repente um assunto interessante: as tomadas de energia elétrica do país. Elas vão mudar, e isso é um absurdo! reclama a aspirante. A modelo conclui, sagazmente, que alguém vai enriquecer com isso (óóóóóó), elas tiram sarro porque o Brazil é um país unico, e portanto a sua tomada tem que ser única, e no final todas concordam com a aspirante... A modelo muda de assunto e diz alguma coisa sobre pessoas ricas e esbeltas e pessoas pobres e gordas (oi?). A jornalista se sente frustrada e muda novamente o assunto: agora é a vez dos pais relapsos. A filósofa exprime sua opinião: antes eu achava que cada um entregava o que tinha, e que ninguém tinha que cobrar ninguém. Hoje eu acho que se o pai tem dinheiro, e é só isso que ele tem, que o filho cobre dele ao menos o dinheiro. Com uma velocidade incrível alcanço o controle remoto: ufa, mute. Quatro macacas continuam gesticulando, bem à minha frente. Não mudo o canal, afinal sou mulher antenada, desapegada e esperta. Deixo-as lá, abandonadinhas, e ponho-me a escrever. Constato com certa tristeza que fui contaminada: nunca escrevi uma coisa tão ruim na minha vida! Tudo bem, sou também uma mulher compreensiva. E esperançosa, porque afinal amanhã ainda tem a Fernanda Young, e esse pode me render um bom post.

P.S.: e viva a televisão brasileira! eeeeeeeeeê