quinta-feira, 29 de julho de 2010

AOS QUE MORREM DE FOME

O México festeja seus mortos. Os mexicanos espreitam e convivem com a morte. Fazem festa para ela, e com ela, e a isso chamam de “Festa dos Mortos”. Eles encaram a morte com uma supremacia soberana. Aproximam-se dela e a frequentam. Fazem da morte não um fim, mas uma ponte entre o mundo dos vivos e o mundo onde vivem seus antepassados. E o mais importante: sabem que a vida os curou do medo da morte, pois é a própria vida causadora de lágrimas. É bonito pensar assim. É poético, até.

A dor da perda de um filho é, provavelmente, a dor de amor-perdido mais doída que um ser humano pode experimentar. Provavelmente, digo eu, porque não sou mãe.

Cissa Guimarães, conhecida atriz global, experimentou essa dor. Lamento muito, de verdade. Não por ela ser quem é (uma pessoa que empresta a sua imagem para entreter a massa), mas por ser um ser humano. Mãe nenhuma deveria ter o desprazer de ter que enterrar um filho. Mas... ces’t la vie, as coisas acontecem.

Hoje, família e amigos fizeram uma homenagem ao jovem morto. Não vi detalhes, mas pelo o que pude perceber foi até, de certa maneira, uma festa. Uma festa em homenagem a uma pessoa que viveu 18 anos, e morreu como tantos outros vivem e morrem todos os dias. Música, homenagens escritas, homenagens em forma de pichações, lágrimas, sorrisos (afinal a vida continua), mas sempre dor, dor, dor... No final, todos voltam às suas casas, em seus carros blindados (estamos falando do Rio de Janeiro e estamos falando de artistas globais) e o que provavelmente será comentado é em como o rapaz era uma pessoa magnífica, cheio de luz, um futuro brilhante e promissor pela frente, etc.

Cada um tem o direito de comemorar seus mortos, ou seus vivos, da maneira que bem entender. Cada um externa o seu sofrimento da forma que bem entender. É uma questão íntima. É cultural. Não importa. Não sei, mas acredito que diante da perda de um filho, eu simplesmente recolher-me-ia, não clamando pena, mas como um movimento natural de interiorização para aprender a superar a falta que um ente querido causa. É lacuna que nunca mais será preenchida, e há que se ter muita habilidade para lidar com o vazio.

Enquanto alguns fazem alarde da morte de uma única pessoa, reflito sobre os que morrem de fome. Milhares deles. Aqui, ali, acolá. Sem homenagens, sem direito a serem velados, sem direito a uma vala. Morrem, deixam de existir e para o mundo é como se não tivessem existido. Enquanto estamos todos bem, seguros em nossas casas, cujas janelas têm grades imensas, vamos levando nossa vidinha.

Não quero abraçar o mundo, nem ser Robbin Hood, mas me dói saber que em algum lugar do mundo, neste momento, uma criança morre de fome. E nenhuma plaquinha em sua homenagem será erguida. Ces’t la vie...

Um comentário:

Hélida disse...

OLá querida,

Já estava com saudade de novas postagens...
Sobre a festa dos mortos no México...quando estudei as culturas pré colombianas ficou bem claro o quanto esta festa é sincrética e que a influencia do povo chamado Mexica foi fundante.
E isto me faz pensar numa outra morte,que não é a física (sobre a qual vc já abordou e bem) mas a morte da cultura de um povo.
Bjs Hé